A Princesa Negra, nuances de um poder ancestral
Zacimba Gaba nasceu livre em África, era princesa do condado Cabinda, onde atualmente fica a Angola. Foi comprada com mais uma dúzia de negros por um escravagista, o fazendeiro português José Trancoso do Norte do Espírito Santo, no Porto da Aldeia de São Mateus em 1690.
Neste período estava acontecendo a invasão dos colonizadores europeus em África, no qual a nação de Cabinda foi afetada, sendo dizimada e a maioria de seu povo tendo como destino as terras brasileiras.
Ao longo dos dias começaram a surgir boatos de que a recém escravizada teria uma origem nobre, que sua verdadeira identidade estaria vinculada a realeza, sendo assim, com esses boatos rondando as propriedades do torturador, Zacimba é levada a sala de José Trancoso para que este se certifique sobre a sua origem e identidade, após a confirmação de que estariam lidando com a princesa de uma nação africana, o medo de uma revolta por parte dos negros era gritante, uma vez que a origem da maioria dos escravizados mantidos na fazenda era a Angola.
Zacimba foi exposta a inúmeras violências, dentre elas no mesmo dia em que revelou sua identidade, foi abusada sexualmente (estuprada) pelo barão e seus capatazes como uma maneira de demonstrar uma superioridade , sendo utilizado tanto como uma noção de dominação sobre o corpo dela, quanto como uma mensagem a seu povo.
Esta era uma mensagem deixada aos escravizados, e principalmente ao povo de Cabinda de que se algo acontecesse com o barão ou sua família, a vida da princesa seria ceifada. Num primeiro momento o povo de Cabinda colocou-se a lutar para libertar a princesa, a qual não deixou que eles se rebelassem sem uma estratégia segura para todos, a princesa seria responsável por elaborar uma estratégia de libertação contando com a ajuda de seu povo para colocá-la em prática.
São Mateus Morro do Moreno
Foram anos sofrendo violências físicas e psicológicas para concretizar o plano de envenenamento, uma prática silenciosa e muito eficaz comum entre os negros como uma forma de vingança aos que colocassem o povo preto em tamanha humilhação, durante esse tempo a princesa foi amadurecendo e aprendendo formas de como resistir ao sistema escravocrata, uma delas foi o canto, nas noites em que passava aprisionada na casa grande os escravizados escutavam sua voz entoando cantos do seu povo, numa tentativa de resgatar suas memórias em África e a conexão com sua cultura e espiritualidade, muitas vezes para elucidando os pensamentos de Zacimba.
Em prol da estratégia para a libertação do povo preto e a morte do escravocrata, durante meses os negros foram envenenando o barão, através da alimentação, eles pegavam uma cobra conhecida como “preguiçosa” , a jararaca , cortando lhe a cabeça, moendo e transformando em um pó. Esta substância era colocada na comida do barão, ressaltando que nesse período os negros não detinham de uma total liberdade ou confiança dos senhores da casa grande, sendo assim por vezes antes do barão se alimentar um escravizado experimentava, uma vez que o medo de uma revolta era constante.
Porém Trancoso, não contava com tamanha astúcia e inteligência dos negros, na qual a ingestão em doses pequenas e em curto prazo deste veneno não causava danos, sendo assim os negros revezavam-se nesta parte.
O dia tão esperado chegou e o escravocrata caiu envenenado, colocando todos em desespero na casa grande, de pronto Zacimba convoca o seu povo, os escravizados invadiram a fazenda,a procura dos algozes. Todos os capatazes foram degolados, apenas a família do barão foi poupada.
Zacimba libertou seu povo e lutou a vida toda como uma guerreira em defesa da libertação do povo preto, queimando navios negreiros, comandando resgate nos navios antes mesmo de atracarem o porto em terras do Norte do Espírito Santo, e formando um quilombo onde hoje se encontra a cidade de Itaúnas. O quilombo era refúgio para tantos outros negros que estavam fugindo da casa grande, como de quilombos que foram destruídos, ela morreu como uma princesa em resgate dos negros em um navio, lutando pela valorização do povo preto, pela libertação e resistência, além de ser um símbolo de luta pela igualdade entre os homens.
Zacimba mostra ao povo preto o poder ancestral e o orgulho que devemos ter de nossa história, ubuntu!
Amei,a luta continua
Tudo bem , nessa quinta saí mais um texto fantástico , obrigado pela sua contribuição compartilhe