Liderança altiva, estratégica e potente. Quem era essa mulher negra?
That’s when I’m gonna stand up
Take my people with me
Together we are going
To a brand new home
Far across the river
Can you hear freedom calling?
Calling me to answer
Gonna keep on keepin’ on
I can feel it in my bones
É quando eu vou me levantar
Levar meu povo comigo
Juntos vamos
Para uma nova casa
Do outro lado do rio
Você pode ouvir a liberdade chamando?
Me ligando para responder
Vou continuar continuando
Eu posso sentir isso nos meus ossos
Tereza de Benguela foi uma mulher negra relegada por muitos anos ao espaço de apagamento. Por meio da luta do movimento de mulheres negras brasileiras e do registro imaterial fornecido pela tradição oral, o famoso “passado de geração em geração”, a história dessa personalidade, importante na construção do país e na trajetória dos movimentos negros pela libertação de seu povo, ficou em evidência. Apesar da tentativa de impor o silenciamento e o epistemicídio contra as estratégias e a própria vida das mulheres negras e de outros grupos das pessoas racializados, Tereza de Benguela tornou-se símbolo de coragem e de heroísmo nacional, uma das histórias que atravessaram e continuam rompendo com os entraves sistêmicos produzidos pelo Estado.
Não se sabe ao certo a data de seu nascimento, acredita-se que ela teria nascido em África, fazendo parte da comunidade de Benguela, principalmente porque por vezes o sobrenome dos escravizados sequestrados era a localidade onde viviam.
Durante o século XVIII, ficou conhecida como “Rainha Tereza” no Vale do Guaporé em Mato Grosso, no qual segundo registros ela foi uma importante liderança do quilombo do Piolho, mais conhecido como quilombo de Quariterê. Tereza comandava um grupo de pessoas negras e indígenas, resistindo ao sistema escravocrata por mais de duas décadas nas matas próximas à fronteira da Bolívia.
Construído em 1730, o quilombo de Quariterê, contava com estratégias potentes e voltadas para o coletivo elaboradas pela Rainha Tereza, uma delas foi o sistema de parlamentarismo na estrutura política da comunidade, onde semanalmente, em um espaço à parte, tinham reuniões para administração e participação dos demais deputados. Dentre eles estava José Piolho, seu companheiro e de maior autoridade. Após o assassinato de seu companheiro, Tereza assume a liderança do mocambo.
Os mocambeiros ainda dispunham de técnicas de defesa, por meio da posse de armas adquiridas nas trocas com os brancos, furtadas ou até mesmo deixadas após as lutas. O mocambo estava em terras férteis, onde a comunidade plantava seu próprio alimento, tais como milho e soja. O desenvolvimento da agricultura possibilitou a fabricação de tecidos e a negociação dos produtos em excesso, gerando um retorno financeiro e de alianças tramadas. Pelo domínio do uso da forja, os instrumentos de ferro utilizados nos conflitos contra os negros eram transformados em materiais de trabalho.
“Governava esse quilombo a modo de parlamento, tendo para o conselho uma casa destinada, para a qual, em dias assinalados de todas as semanas, entravam os deputados, sendo o de maior autoridade, tido por conselheiro, José Piolho (…). Isso faziam, tanto que eram chamados pela rainha, que era a que presidia e que naquele negral Senado se assentava, e se executavam à risca, sem apelação nem agravo”
(Anal de Vila Bela do ano de 1770).
Em 1770, Tereza de Benguela foi presa pelo Estado, as incertezas sobre a sua morte rondam sua narrativa, entretanto acredita-se que a rainha teria sido assassinada pelos soldados a mando de Luís Pinto de Souza Coutinho, governador da capitania de Mato Grosso. O Quilombo de Quariterê resistiu em terras mato-grossenses até 1795.
Assim como Tereza, inúmeras mulheres negras seguem confrontando o Estado, exigindo o direito à vida e às condições básicas da manutenção para a vida em coletivo, resistindo às atrocidades e aos entraves colocados pelo lastro do sistema escravocrata. Ainda assim mulheres negras são presas por resistirem aos soldados do Estado, haja vista o caso da mulher negra de 51 anos pisoteada por um policial em São Paulo.
Em 1992, na semana do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, entre os dias 19 e 25 de julho, um grupo de mulheres negras de mais de 70 países instituíram o dia 25 de julho como o Dia da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha. Entretanto, depois de anos, foi apenas em 2014 por meio da Lei nº 12.987/2014, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, que a data 25 de julho fica marcada como o Dia Nacional de Tereza de Benguela.